Em minha casa há duas malas.
A que se usa para passear, e a que se usa para ir embora.
Esta tarde ele pegou a mala de ir embora. Tirou toda a poeira, esfregou com o escovão e pôs ao sol.
A mala de ir embora nunca foi usada. A de passear vivia velha e acabada.
Já foi ao México, já foi a São Paulo e Rio.
E ia para Tocantins fazer sei lá o que.
Essa noite ele pegou a mala que agora recebia a frieza da lua e
Colocou tudo dentro.
As ilusões, as roupas, o coração em pedaços, as lágrimas, os risos e seu caderno de mentiras bem usadas, e a fechou com cadeado.
Saiu arrastando-a até a porta, pegou o casaco de orgulho tão velho e sujo e se vestiu.
foi embora essa noite.
E eu fiquei olhando a porta fechada. E os dias se foram também
e os meses e os anos. Os invernos iam e vinham, o verão ia e vinha, e eu me esqueci.
Dele e de mim.
Quem eu era antes de te conhecer?
Não sei. Não lembro.