quando disseram-me que eras uma Mangueira
nomeando-a, acreditei conhecer-te deveras, quando ali apenas jazia a verdade.
agora, tão próximos, com os olhos de quem desconhece,
sinto - não vejo - caírem suaves gotículas que dão à tua sombra
uma reconfortante e aprazível sensação de frescor, onde antes, era tudo calor!
deleito-me em curiosidades ao reparar no brilho lustroso das tuas folhas verdes
já não és só A Mangueira e reparo por inteiro o seu esplendor!
sinto a textura porosa dos galhos e do tronco
e as curvas sinuosas das raízes semi encobertas …
teu fruto tem sabor diferente, bem o sinto.
resumem - na irregularidade das formas, todas a tuas necessidades e privações:
recursos do solo; estiagens; pragas; insetos...
nada que lembre os frutos perfeitos e padronizados das prateleiras dos supermercados
que atendem apenas às necessidades do consumidor!
há uma dignidade natural em existir
que faz de ti, mais do que uma simples mercadoria-manga
uma dignidade que não reparei ao acreditar conhecer-te pelo que não eras,
tomando-a apenas pelo teu nome!
é quase uma violência, atribuir a mim um nome e uma alma e a ti um nome sem alma
essa quase violência, reflete-se nas esquinas e vitrines da cidade
e espraia-se na destruição e exaustão dos recursos do planeta
sugerindo um sombrio e macabro cenário de apocalíptica revanche natural.
mas como pode a natureza vingar-se, sendo eu naturalmente parte dela?
ao atribuir-me uma alma e um nome, e a ti somente um nome sem alma
torno-a estranha e diferente, mesmo sendo nós partes do Mesmo
ao julgar que a tudo conheço - sem ao menos conhecer-me
idealizo o que é, pelo que não é, e perco-me!
olho-me no espelho e busco respostas para aquele que vejo
e intuo que não sou aquele que imagino conhecer.
o que vejo? o que sinto? o que sou? Diga-me Homo Sapiens…digna-me!
Marcelo E. de Oliveira
Maricá, 29/03/14