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O tio acumulava. Ele descobriu tarde demais, agora o Diógenes já está morto!

O tio acumulava. Ele descobriu tarde demais, agora o Diógenes já está morto!
Sérgio Pacheco
May. 5 - 5 min read
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Foi só receber o telefonema e o sobrinho partiu correndo para Goiânia. Disseram que quando o pessoal do SAMU entrou no apartamento o Diógenes já estava morto há dias. Sofreu um infarto!

 

“- Queira Deus que tenha sido infarto fulminante! Assim meu tio não terá sofrido tanto”. Dizia o Neubert para a esposa, enquanto dirigia o carro na estrada, a caminho de Goiânia. Seus olhos estavam cheios de lágrimas.

 

O querido Tio Diógenes era um homem reservado. Professor universitário, morava sozinho em um apartamento no centro da cidade. Tinha vindo de Minas, aprovado no concurso público, há algum tempo atrás. Foram os colegas que sentiram a falta dele e chamaram o socorro. “Não perdia um dia se quer de trabalho, algo com certeza tinha ocorrido. Eram quase uma semana sem notícias”.

 

Diógenes sempre foi o mais inteligente da sua família. O pai do Neubert disse uma vez que o irmão, desde criança, era um “gênio” na matemática, passava horas e horas se dedicando às fórmulas, mas nunca teve sorte em matéria de relacionamento com as pessoas, especialmente com as mulheres.

 

Diógenes conheceu a Anita, sua maior paixão, na faculdade. Eram dias felizes aqueles! Namoraram por dois anos, mas a moça o deixou ainda antes da formatura. Trocou a calma do rapaz pelo amor impossível e a paixão incontrolada pelo professor de Química Industrial.

 

Aquilo foi um trauma para o jovem Diógenes, ele sentiu mesmo o golpe! Daí desencadeou-se uma sucessão de reações e posturas perante a vida.

 

Ele se enveredou nos estudos, como forma de esquecer a desilusão amorosa e deixar a cabeça sempre cheia de ocupação. Emendou a graduação com o mestrado e, logo a seguir, o doutorado. Aquilo parecia até um vício! Anos depois ele se tornou um “Doutor em Química”.

 

Aprovado em concurso, o Professor Diógenes tornou-se uma referência na universidade. Era admirado pelos seus pares da academia. No entanto, eram raros os colegas com quem ele conseguia trocar palavras e ideias comuns sobre as coisas da vida.

 

O Diógenes aos poucos foi se afastando de vez da família e dos colegas. Andava descuidado com a aparência e tinha tendências à depressão. Por outro lado, ninguém mais suportava o comportamento do homem. Era metódico, organizava tudo e evitava o convívio social. Parou de sorrir e não tinha paciência para papo-furado.

 

O maior prazer do Professor Diógenes era adquirir livros e peças para o laboratório que montou no apartamento. Aos poucos, o lugar se tornou um labirinto, quase um “santuário”. Eram livros amontoados em armários e mesas. A sala quase não tinha espaço para se sentar ou locomover. Já não tinha mais quem lhe ajudasse na faxina, dispensava todas elas por não saberem lidar com seu “cantinho”.

 

Intolerante com a maioria, ele só considerava a companhia do sobrinho Neubert, a quem inspirava pela dedicação aos estudos. O rapaz ingressou na faculdade e estudava Química, sob orientação do tio. Assim, duas vezes ao ano Diógenes retornava à Minas. Vinha ter com o sobrinho Neubert, agora iniciando a vida de casado. Tinha tanto carinho pelo rapaz, que ajudou ele a construir sua casa. Dizia ao sobrinho para comprar o material necessário e lhe “passar os boletos”. Pura gratidão!

 

Quando vinha à Belo Horizonte, não ia direto para casa do Neubert. Tratava mesmo de se hospedar num pequeno hotel, no centro da cidade. O mesmo há tempos, já era até conhecido pelo gerente do lugar. Era preciso que o sobrinho viesse até o hotel e buscasse o tio para hospedar em sua casa. Um ritual que não mudava e o Diógenes fazia questão! Com o passar dos anos a relação já era de pai e filho. Mas nunca convidou o sobrinho para estar com ele em Goiânia.

 

Naquele dia, quando o Neubert chegou no apartamento de Goiânia, ficou chocado com o que viu lá dentro: pilhas e mais pilhas de livros e instrumentos de laboratório. O odor era terrível, há muito não havia limpeza no lugar.

 

O tio estava doente, a “síndrome do paciente acumulador”. Ele descobriu tarde demais, agora o Tio Diógenes já estava morto!


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