Mãe, já terás percebido, que não quero nascer?
Para viver e quase em seguida morrer
Será que entendeste por fim o meu silêncio
De pausas; sem pontapés nem outros movimentos
Que mau presságio, que estranho artifício
Esta inércia planeada, sem reservas nem constrangimentos
Que te inquieta, e dói como um pesadelo de mãe
Vivo ou da morte refém.
Sossega que eu vivo na penumbra do teu ventre
E sinto e respiro como tu, certamente
Eu só te queria chamar a atenção
Para esta tempestade, esta grande maldição
Que vislumbro pela transparência do teu ser
Sim, porque eu consigo entrever
E descortinar o que nem sequer ousava imaginar
Homens sem força, contidos, escondidos,
E esta peste no ar
Da China veio um tufão,
E um outro vento louco, sirocco
A oeste se juntou, em turbilhão,
Como uma nuvem de fogo
Indiferente ao pavor da multidão
Sequiosa, sem fronteiras nem destino
Espalhou-se na escuridão
Com a perfídia dum veneno clandestino.
Esta sombra de morte que anoitece o dia
Como um feitiço, uma assombrosa magia
Tem requintes de malvadez e crueldade
Invisível, trespassa-nos em qualquer idade
E nada podemos fazer para a deter
Pois é um inimigo desigual, difícil de combater
Acreditamos porém que a forçada solidão
Seja uma força credível e quiçá a salvação
Por isso mãezinha querida, deixa-me estar no teu nimbo
No conforto em que me encontro, neste oásis de frescura
Algumas semanas mais, eu prometo, te darei toda a ternura
Deixa a tempestade passar, os miasmas deste ar, a escuridão, o cacimbo
Quero nascer para ver o sol, o céu, o mar, e o poisar das borboletas
De flor em flor
Ao teu lado no jardim
À sombra de tamarindos, numa pérgola de marfim.
Não me expulses por favor.
#Poesia#Concurso#Eternizarte