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Corações Navegantes

Corações Navegantes
Cesar L. Theis
Jun. 22 - 4 min read
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Deitado na rede avisto no horizonte o influxo afável do pôr do sol, colorido com uma luz coral avermelhada, então sou interrompido da contemplação despretensiosa no instante derradeiro de um preguiçoso embalo pôr um pensamento, destes alheios, que surgem a esmo e sussurram em terceira pessoa a consciência... “deverias conquistar aquela por quem alimenta amor e tanto suspira, lá está, vai alcançá-la”, mas, então um despropósito opositor da consciência... mas, e se ela decidir seguir pela mesma direção, a distância entre nós não decrescerá... e definitivamente continuaremos separados.

E então aprofundando a cogitação... não devo seguir no sentido do seu encontro, que é intento nulo, e vinga um pensamento de antítese ao primeiro... o movimento mais tangível é seguir ao sentido oposto, navegar guiado pelo brilho da estrela polar e circundar a terra em direção ao encontro futuro - agora já estava a viagem de Fernão de Magalhães... e ela as Índias das valiosas especiarias.

            Contudo, a solução parecia frágil... talvez pudesse me guiar pela sua imagem visível. Mas, e se a percepção da lonjura estiver equivocada? Logo preciso pôr segurança de navegante presumi-la distante, evitando o perigo do embuste da perspectiva... agora ciente que no presente ela é inalcançável pela distância, já que o tempo da viagem produziria o girar dos ponteiros... e o presente tornar-se-á lembrança, memória chamada passado, e o futuro transformar-se-á em presente... acabaria incessante navegador de tempo, alternando entre presente e futuro no encalço de uma miragem errática... enquanto ela permanecerá em insuperável lonjura.

E, se me atrever a chamar por ela... um sussurro será inócuo pela presumida distância; então devo gritar e o eco há alcançará no futuro, e outra dúvida... mas e se ela embarcada nas rápidas voltas da terra não me ouvir? Então pela sua ausência as palavras engarrafadas no avocado ressonante apenas permanecerão à deriva pelo infinito do universo.

            Neste momento pressentia estar irremediavelmente ensimesmado... desnorteado com devaneios geográficos e filosóficos, estranha forma do pensamento reclamar atenção, vivia a me escarnecer com enunciados a princípio simples, mas, que se revelavam armadilhas ao ócio das minhas vagabundagens ao crepúsculo... que aguaritados pelas constantes insônias comumente acabavam se espraiando pela madrugada até o dilúculo.

Porém, o propósito exige ainda versar os argumentos, reclama o pensamento um desenlace... navegar para encontrá-la, reconhecido o contrassenso que navegar para longe é rota que dela me aproxima, porém sei que acabaria por navegar pelo mundo às avessas, habitado pela solidão sucumbindo aos artifícios da loucura.

E então um calafrio, mas, e se ela está naufraga a espera em alguma pequena ilha de nome desconhecido pelo meu resgatar? Emerge uma repentina heresia “então deveras só lhe resta a fé no acaso de um improvável sucesso de uma viagem sem mapas”.

 Desponta uma insegurança... e se quando eu partir para as lonjuras na direção oposta, ela mudar de ideia sobre seu destino e decidir pôr-se a procurar-me? Esmaga-me uma certeza... então será ela que apaixonada perseguirá incessante apenas o reflexo errante da minha existência navegante. Balbucio uma jura simples... jamais eu não farei porto no abraço de outra mulher.

Então, temeroso com o coração ancorado em incertezas, absorto nesta ilha chamada presente, desprovido de direção, consciente de que acabarei por marear em círculos por navegar a um futuro sem norte, sem as centenas de constelações cingidas no azul dos teus olhos, resta badalar aos céus a espera de alguma casual comiseração.

Enquanto, o mar imita o preguiceiro balanço da rede... no breu do manto da sonoite, uma gigantesca lua cheia emerge no horizonte desenhando um caminho dourado por onde navegarei ao reino dos sonhos de Morfeu, então talvez possa abarcar algum presságio que revele no espaço-tempo a localização do teu beijo.


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