Conversa entre o Prezado e o Amigo
Ah, prezado,
e o amor?
O que houve
com a sua ânsia
de amar, amar,
desamar e amar
outra vez?
Estava tão
tatuado e color
nessa tua tez!
Ah, meu amigo,
confesso que não sei.
Tenho a impressão,
das mais pessimistas,
de que ele me viu
assim, compondo versos,
jurando eternidades
que durariam
enquanto durassem,
e se foi,
com receio,
não sei ao certo,
de que eu pudesse
estar doente.
Devo tê-lo visto
dobrando a rua,
logo ali, na esquina –
tão perto o desgraçado!
Não sei
se olhou para trás,
se hesitou um pouco,
se se compadeceu
do “doente” que,
pela primeira,
tão subitamente,
se descobria
da terra árida,
e do seu
deserto particular.
Mas, prezado,
não pode ser!
Tenho ouvido maravilhas
sobre o amor,
de como ele tem...
operado milagres.
Essas “cantigas de amor
sem eira nem beira”,
esses “ beijos que se beijam,
essas mãos que se conversam
e viajam,
sem mapas”!,
ah, prezado, creia-me,
é a realidade
dos meus ouvidos,
não é coisa de
itabirano, poeta presente.
Também não é cousa
de Pessoa que
conversa com as estrelas,
que não conhece
“outra razão para amar
senão amar”,
mesmo que quando
“fala: parece que mente”,
e quando
“cala: parece esquecer”.
O amor está além disso –
creia-me, eu ouvi!
Ouviu demais, meu amigo,
ouviu demais.
O amor não veio,
e se veio, como lhe falei,
foi-se embora,
me confundindo com um doente,
temendo que ... sei lá,
que meu coração parasse,
por algum sintoma coronário.
Estou saudável –
antes que se preocupe.
Mas estou doente,
perdidamente, doente,
por querer amar –
e talvez eu ame –
sem ter de volta,
esse amor fujão,
vagabundo, sem teto,
sem paragem,
sem permissão
que, mesmo assim,
entra, e sai,
e não volta,
e não se explica,
e foge,
e arde,
e atormenta,
e amaldiçoa...
Ah, prezado,
não fiques assim,
tão jururu.
Ainda que não tenha
“filme do Carlito”,
ainda que “o mundo
seja um malmequer”,
não “te atormentes”,
não te devores,
não fiques aí
tão acorrentado!
O dia é novo,
pois “hoje é já
outro dia”.
Tenho ouvido maravilhas
sobre o amor e, creia-me,
ele há de volver a ti novamente,
num “descontentar de contente”,
numa dor desatinada que não dói,
mas que te faz florescer.
Prezado, ainda assim,
não se deixe pressionar por esses versos,
nem por esses poetas.
o amor nem sempre está no celeste,
na pena ensanguentada,
ou no ar rarefeito.
Ele está em ti, ele és tu.
E creia-me:
quando menos esperar,
o coração terá dado voltas e mais voltas,
e você entenderá, enfim,
o que significa ser um milagre.
O amor e você são um milagre.
(MARTINS, Luciano R.. Sexta, 10 de abril de 2020.)
*Reeditado em maio de 2022.